segunda-feira, novembro 07, 2005

Violências

Do rio, que tudo arrasta na sua passagem, dizem que é violento.
Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.

Bertolt Brecht

6 comentários:

  1. Podemos eleger Felgueiras, Isaltino e Valentim, podemos ter a incapacidade de conseguir ver quanto este país está atrasado por falta de vontade polítca (e não só) mas não cometemos este tipo de terrorismo desordenado e extravangante. Sim, foi a gota de àgua que fez explodir uma série de problemas sociais e raciais, mas nada justifica este caos. Mas que culpa têm as pessoas que ficaram com os carros queimados para estarem a ser objecto de protesto desmedido. Animalescas estas manifestações, mas também a lancarem-lhes achas para a fogueira ... enfim .. espero que isto não se estenda até aqui à nossa Damaia e Porcalhota.

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  2. "(...)as pessoas que ficaram com os carros queimados" naturalmente que não têm culpa alguma. Infelizmente trata-se de "danos colaterais" que sempre acontecerão em qualquer revolta ou guerrilha. Ou estavas à espera que os jovens se armassem em heróis e fossem de peito aberto, a cantar a Internacional, "tomar a Bastilha"?

    O Poder trata as pessoas — não sei se reparaste que são pessoas?!… — como animais, condenando-as a "viver" em ghettos, sem trabalho, sem acesso à educação, em condições promíscuas, insalubres e sem qualquer dignidade, negando-lhes ano após ano quaquer esperança num futuro melhor e depois ficam chocados com a forma "animalesca" — eu prefiro considerá-la violenta — como se manifestam? Achas mesmo que se elas o fizessem de forma "civilizada" alguém iria querer saber do seu problema??? Pois eu acho que não e aí é que está o mal: o sistema, em vez de prevenir, resolver, reformar, como há anos vem apelando a própria Igreja francesa, deixa andar — por incúria? por incapacidade? — e depois, sem se dar por ela, a revolta — ou é mesmo a Revolução? — está na rua! E não adianta considerar esta gente um bando de delinquentes ou criminosos de delito comum. Não assaltam nem roubam em proveito próprio. São, isso sim,"criminosos" políticos que lutam, sem dó nem piedade, contra um sistema que, sem dó nem piedade, os exclui e tudo lhes nega. Como "criminosos" foram os que fizeram a Revolução Francesa. E os contestatários do Maio de 68.

    Enfim, como Engels bem demonstrou, a História não teria avançado sem violência!

    Também eu "espero que isto não se estenda até aqui" mas, da forma como os imigrantes (particularmente africanos) aqui têm sido tratados, em muitos casos pior do que em França, não estou tão seguro que tal não possa vir a contecer. Infelizmente…

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  3. Acho que só mesmo quando algumas pessoas virem os seus "carros queimados" é que não vão achar tão propositada este tipo de manifestações de destruição.
    Claro que nas revoltas existem sempres danos colaterais, tal como na guerra morrem muitos inocentes, mas será que nós queremos desculpar a guerra.
    E porque dura esta revolta já tantos dias, estão à espera de uma decisão (aqui sim convém) civilizada para os seus problemas como consequencia deste tipo de manifestações. Vou ser despedido amanhã, deixa-me lá ver o carro que vou partir entretanto.
    Não é desta forma que os seus problemas vão ser resolvidos. Talvez sejam atendidos

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  4. Acho inquietante a forma INDIVIDUALISTA como colocas a questão (sinal dos tempos? ou de uma geração que, como diz Saramago, é a geração da indiferença e do esquecimento?):
    — "só mesmo quando algumas pessoas virem os seus "carros queimados" é que não vão achar tão propositada este tipo de manifestações de destruição".
    Pois eu e muito boa gente, certamente não corremos risco de ver os nossos carros queimados e nem por isso deixamos de estar preocupados ( e muito) com esta grave situação, e com a forma como os problemas que a ela conduziram foram ignorados sistematicamente ao longo dos anos (mesmo hoje, ainda há quem defenda que a melhor solução é dar porrada na "escumalha" — será caso para perguntar, "e não se pode exterminá-los"? Resolvia-se o problema de vez…).
    — " Vou ser despedido amanhã, deixa-me lá ver o carro que vou partir entretanto."
    Honestamente, vês aqui alguém a agir de forma individual e individualista? Vês aqui alguém a roubar carros ou a assaltar propriedades? Trata-se, isso sim, de uma luta colectiva (se calhar uma outra forma de luta de classes que Marx não previu), uma luta política contra um sistema que lhes tem negado os direitos mais elementares.

    Dizes que "estão à espera de uma decisão (aqui sim convém) civilizada para os seus problemas"!
    Não é verdade. Se continuassem indefinidamente à espera, como fizeram os seus pais, a tal “decisão civilizada” nunca surgiria e estariam condenados a vegetar à margem da sociedade. A solução que for encontrada será, por isso, fruto da sua luta desesperada, odiada por muitos, mas compreendida por muitos mais, neles se incluindo a própria Igreja.

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  5. Hofstede em 1991 fez um vasto estudo multicultural onde veio, entre outras coisas, sistematizar as diferenças existentes em vários países em termos de individualismo e colectivismo, e onde apresenta uma série de características presentes em cada tipo. Portugal é o mais colectivista, os EUA o mais individualista, ficando a França Irlanda e Noruega pelo meio. A ideia de que ser individualista é negativo e que o colectivo é positivo mais uma vez não passa de um mito. A realidade é que tudo depende da cultura e das circunstãncias. Está provado (ver estudo de Antonio Fidal) inclusivamente que paises mais individualistas têm maior facilidade em trabalhar em grupo, ou contrário dos colectistas que apresentam maiores dificuldades no trabalho de grupo. Isto para desdramatizar a inquetante forma individualista (em minúsculas) que também merece ser analisada.
    Eu também compreendo os motivos desta manifestação (salvo seja, já vamos no 13º dia com centenas de disturbios aleatórios) agora a forma vândala como está a progredir, tira-lhes toda a razão. Vão destruir os carros dos ministros e a instalações dos ministérios, agora escolas, carros particulares. Eu insisto, só quando os azares nos batem à porta é que compreendemos realmente o que é passar pelas situações.
    Eu já estou como o ministro, que teve a infelicidade de falar com o coração, uma vez identificados os kaids é correr com eles, não, eu não chego a colocar a exterminação como é obvio, mas estes actos estão cada vez mais organizados e pelas noticias começa a haver aproveitamento para instrumentalizar uma guerrilha urbana como relata o El Mundo espanhol. Estamos perante algo que nasceu espontâneo com determinados objectivos sociais mas está a ganhar uma forma devidamente organizada com outros objectivos. É claramente uma falha do sistema de integração social francês.

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