sábado, junho 21, 2008

O funeral da gestão democrática

Tudo começou com a aprovação desse rol de malfeitorias eufemisticamente designado de Estatuto da Carreira Docente. Na realidade, as desgraças com que o actual Governo nos tem vindo a brindar já lá estavam todas: a divisão da carreira em categorias, a existência de quotas de avaliação e de vagas para acesso aos escalões de topo, o aumento dos horários de trabalho, o exame para ingresso na profissão, a extinção dos quadros de escola, a perda de tempo de serviço por razões de doença legalmente comprovada, entre muitas outros mimos. Mas nós, porventura mais preocupados com o nosso trabalho e com os nossos alunos, ou pensando que a coisa não viesse a ser tão feia como parecia, esperámos para ver. E calámos. E, como é sabido, quem cala consente.
Veio depois o concurso para professor titular e, com ele, a divisão artificial e artificiosa da classe docente em professores de primeira e professores de segunda. Mas nós, ainda que tal nos parecesse injusto e injustificado, alinhámos no jogo.
Seguiu-se a avaliação do desempenho e então, finalmente, o nosso descontentamento acordou, engrossou, alastrou de norte a sul. E culminou num protesto como jamais se viu. Parecia que desta vez tínhamos feito valer as nossas justas razões. Mas houve alguém que se/ nos enganou. E tudo voltou à estaca zero. Ou quase.

Ao mesmo tempo, era aprovado o "novo" regime de gestão que vem extirpar de vez a democracia da Escola Pública: acaba com a direcção executiva colegial (impondo a figura do director omnipotente) e com a sua eleição por sufrágio directo e universal, põe fim à eleição dos coordenadores das estruturas pedagógicas intermédias pelos professores, reduzindo-os à mera condição de "funcionários" e, depois de no projecto inicial considerar, de forma humilhante e vexatória, que os professores não tinham os mesmos direitos que os outros elementos do Conselho Geral, concede-lhes finalmente o "favor" de também poderem ser eleitos para a presidência daquele órgão.
Por isso temos vindo a ser convocados para a farsa eleitoral para o Conselho Geral. Convidados a candidatarmo-nos, a votarmos, a legitimarmos, ao fim e ao cabo, o estabelecimento do poder autocrático nas nossas escolas.
Mas, desta vez, a minha memória ainda está bem fresca. E dorida. Por isso não me candidatei. Por isso não votei. De mim não hão-de dizer que participei no funeral da gestão democrática.

Aurélio Malva, 20/06/2008

quinta-feira, junho 19, 2008

O milagre não aconteceu (mais uma vez)

A eficácia alemã acabou com Portugal. Mas tal não aconteceu por acaso. Nem por milagre. No futebol, como na vida, só há uma receita para progredir e triunfar: precisamente aquela que faz da Alemanha um dos países mais desenvolvidos da Europa — trabalho, competência, organização, seriedade, colectivismo.

Por cá, os tugas preferem engalanar as casas e os automóveis com bandeiras nacionais e implorar o apoio da Virgem de Fátima ou da sua homóloga de Caravaggio.
Por este caminho, em dez jogos com a Alemanha, Portugal talvez ganhe um. E, pior e muito mais importante do que isso, nunca mais deixará de ser um dos países mais pobres e desgraçados da União Europeia.

terça-feira, junho 10, 2008

Ou vai ou racha!… Será que vai mesmo?…

Depois da gaffe de Cavaco, para desenjoar, sugiro vivamente a audição de De coração e raça, de Sérgio Godinho…

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"Sou português de coração e raça
Não há talvez maior fortuna e graça"
(De um conhecido hino)

Sou português de coração e raça
meio século comido pela traça
fechados numa caixa
e agora ou vai ou racha
e agora ou vai ou racha

Agora vamos é ser
donos do nosso trabalhar
em vez de andar para alugar
com escritos na camisa
e o dinheiro que desliza
do salário prá despesa
compro cama vendo mesa
deito contas à pobreza

Sou português de coração e raça
meio século comido pela traça
fechados numa caixa
e agora ou vai ou racha
e agora ou vai ou racha

Agora vamos é ser
donos do nosso produzir
em vez de ter que partir
com escritos numa mala
e a idade que resvala
do nascimento prá morte
vou pró leste perco o norte
e o meu corpo é passaporte.

Sou português de coração e raça
meio século comido pela traça
fechados numa caixa
e agora ou vai ou racha
e agora ou vai ou racha

O dia da "raça"

A sucessão de acontecimentos tem sido de tal modo avassaladora que nos sentimos constantemente ultrapassados e sem fôlego para acompanhar a realidade.
Os aumentos quase diários dos preços absolutamente incomportáveis dos combustíveis e a paralisação dos pescadores, primeiro, dos agricultores, depois, e dos camionistas, agora, a que se junta o gigantesco protesto dos trabalhadores contra as alterações ao Código do Trabalho, ameaçam colocar o país à beira do caos e da completa paralisia. O Governo, que vai perdendo a sua arrogância e se desfaz a cada dia que passa, receando o desastre eleitoral mais que previsível, refugia-se no autismo e na ausência de diálogo e manda a GNR tratar do assunto.
Ao mesmo tempo, para se alhearem da crise, os tugas vão para a praia apanhar banhos de sol, enquanto esperam por mais uma jogatana de bola da nossa milionária selecção, com os checos.
Instado a comentar a situação, o Presidente da República, de forma infeliz e certamente involuntária, diz que prefere sublinhar, acima de tudo, a raça, o dia da raça, numa alusão a valores e ideologias que julgávamos definitivamente enterrados com a ditadura.
Mas, já nada me espanta neste Portugal que, de Abril, pouco ou nada conserva…
Na RTP, Cavaco fala aos dignitários do regime e distribui-lhes as comendas do costume. À mesma hora, para estupidificar ainda mais o pagode, o nacional-cançonetismo de sempre é receita infalível: na SIC, Ana Malhôa, e na TVI (para não lhe ficar atrás), Mikael Carreira!

Ó meus amigos, será que tudo isto não passa de um pesadelo? Belisquem-me, por favor, e digam-me que nada disto é verdade!…